quinta-feira, 30 de abril de 2015

Petistas estão se desencantando com o PT?



Fui mais uma das milhares de pessoas que acreditaram que o Partido dos Trabalhadores não seria apenas mais uma promessa. Fui mais uma das milhares de pessoas que se iludiu com a imagem carismática de um sindicalista perseguido pelas suas idéias. Fui mais uma dentre milhares de pessoas que deu um voto de confiança ao seu carrasco. 35 anos depois de haver acreditado naquela mentira (eu era jovem) me pergunto "porque foi tão fácil me deixar enganar?"... E respondo: "porque eu preferi ouvir o que eu gostaria de ouvir". 

Já me afastei do PT há muitos anos, mas quando vejo o relato de "ex-petistas" que só agora estão tomando consciência do quanto se deixaram iludir, me sinto um pouco na sua pele. Admito, É DIFÍCIL ADMITIR; o melhor é sonhar. Mas eu optei pelo amadurecimento, e hoje me vejo aqui, defendendo posições de direita... Se me dissessem isso na minha época de faculdade eu não acreditaria.

Enfim, vamos ao assunto que me trouxe aqui: a última e mais ilustre remanescente petista a abandonar o barco do PT é a polêmica senadora Marta Suplicy. Ela alega que sua decisão se deveu ao fato de o PT haver se desviado dos seus princípios - falta a ela se dar conta de que este partido SEMPRE esteve comprometido com a legenda do Foro de São Paulo; vamos dar tempo a ela.

Mas o relato que me deixou emocionada, foi de um militante petista que se dispôs a ir ao ato do dia 15 de março para "cobrir a matéria". Ele saiu de casa com uma idéia do que encontraria e ao chegar na Paulista se deparou com uma realidade completamente diferente e só então percebeu o que está realmente acontecendo. Cairam os véus que o impedia de ver com clareza o significado daquele dia. As suas impressões estão nas páginas do Facebook e no site Domínio do Fato. Vou reproduzí-lo para quem quizer ver.

Não é comédia; é terror
O ato pelo impeachment da Dilma não foi uma repetição da generalização vazia dos atos de junho de 2013. Muito menos foi uma sequência do ódio irracional e raivoso dos eleitores do Aécio nas eleições de 2014. Tem gente fazendo a lição de casa. Enquanto isso, a esquerda continua parada no pedestal de seus computadores, na esperança de que fazer piada com a despolitização alheia fará a direita se envergonhar e parar de militar.
Dia 15 de março nasceu com ar de esperança. Não só para as centenas de milhares de pessoas que sonham ainda com impeachment da atual presidente Dilma Roussef, mas também para mim e alguns tantos jornalistas preparados para capturar em foto e vídeo algum dos que deveriam ser os momentos mais engraçados da política brasileira. Prontos para desmascarar, com humor, a verdadeira face de um movimento reacionário disfarçado de democrático. Aparei a barba, coloquei uma camisa polo preta – porque eu me respeito demais para ir de verde e amarelo -, me vesti pronto para escrever o artigo mais cômico da história do jornalismo brasileiro. Mas o que deveria ser uma obra de comédia rapidamente se transformou em uma história de terror. Ao chegar à concentração do ato em Florianópolis, falei ao meu amigo: “hora de encontrar alguns cartazes do Sul é o Meu País”. Não encontrei.
A verdade é que o cenário que imaginávamos para o ato está cada dia mais distante da realidade. Havia pobres, negros, bandeiras do movimento LGBT, mulheres no palanque fazendo discursos, famílias e muita, muita gente. É claro, os atos ainda são majoritariamente brancos, ainda existem comentários misóginos, movimento anticotas, discursos violentos e um ou outro cartaz de intervenção militar. Mas, o retrato da barbárie, o analfabetismo político, o fascismo, o extremismo e a ignorância estão cada ato mais difíceis de encontrar. Essa massa gigantesca está mais diversificada, mais coesa e, sim, mais politizada. Politização de direita, mas ainda sim politizada. As pautas estão cada vez menos genéricas e vazias; o discurso anticorrupção deixou de ser raivoso e começou a ter conteúdo, as entrevistas estão cada vez mais afinadas, o financiamento é por doação e venda de camisetas, eles têm jingles e usam sem cerimônia músicas de Vandré, Raul Seixas ou Legião Urbana. O apelo à nação e a dicotomia do vermelho contra o verde e amarelo completam essa cena trágica para esquerda brasileira.
E eles estão aprendendo. Enquanto estava ao lado de um dos únicos cartazes pedindo intervenção militar, preparado para um furo de jornalismo humorístico, escuto o grupo comentando que a organização do ato tentou retirar os cartazes deles, pois não representavam o movimento. Como não conseguiram, os organizadores foram mais espertos: subiram no palanque, defenderam a liberdade de expressão e por isso deixaram os cartazes. Em seguida avisaram que o ato chamado é contra intervenção militar, e que todos ali querem uma saída democrática, saindo aclamado por quase todos os manifestantes. Em outros momentos, os manifestantes zombavam as críticas que recebiam, “alguém ganhou 35 reais para estar aqui hoje?” o caminhão de som perguntava, e milhares de estrondosos manifestantes berravam “não” em uníssono; “vão te chamar de coxinha. Se coxinha é lutar pelo Brasil, então não tenham vergonha em serem chamados assim”, os manifestantes aplaudiam.
Quando o ato finalmente se movimentou, quase 30 mil pessoas marcharam mais determinadas, resistentes e informadas do que antes. A maior tempestade do ano começa e, do outro lado da cidade, todos os meus colegas de esquerda se regozijam em seus computadores. “Vamos ver se playboy e madame agüentam chuva”, “São Pedro é comunista”, “nunca uma chuva foi tão providencial”. Se tivessem me perguntado algumas horas atrás, eu concordaria completamente com eles. É uma manifestação da elite, entendem? Eles nunca se manifestaram antes, eles não têm tanta convicção política quanto eu tenho nos atos contra o aumento da tarifa. Eles não vão desmanchar os alisamentos, as maquiagens e arriscar ficar doente. Coxinha molhada não se manifesta, certo? Pelo contrário, eles pareciam retirar força da chuva e, com exceção dos pais que tiraram as crianças, a marcha seguiu com força total, na chuva, pulando e cantando em plenos pulmões “quem não pula é petista!”, violentando a minha memória, mas fazendo todo sentido para eles.
Para nós, da esquerda, só tem sobrado o moralismo da política, o purismo como forma de tentar se defender e deslegitimar as manifestações da direita: criticamos os cartazes surreais, esquecendo que em nossos atos, mesmo menores, sempre há doidões com pensamentos e cartazes bizarros. Tiramos sarro de quem tira selfie, como se isso fosse realmente um problema político. Apontamos sua insensibilidade quando os vimos se manifestando de lado de moradores de rua, como se não acontecesse exatamente a mesma coisa em nossos atos. Rimos dos erros de português nos cartazes, como se nossos cartazes seguissem perfeitamente a norma culta (ou como se não entendêssemos de preconceito lingüístico). Generalizamos indevidamente os mais extremistas e conservadores, atribuindo que todos os outros manifestantes pensam igual. Chamamos de fascista quando os manifestantes ofendem ou usam violência quando alguém de esquerda aparece para provocar, mesmo acontecendo exatamente a mesma coisa quando aparece alguém de direita em nossos atos. Todas as críticas que nos sobraram acontecem de igual forma nos atos organizados por nós, são as contradições normais do movimento e, quanto mais gente, mais possibilidade a aparecerem doidões. E eles estão com muito mais gente.
E eu entendo que as críticas às selfies, ao extremismo, aos erros de português são mais que mero moralismo. É a tentativa de mostrar a contradição de um grupo que se diz mais letrado, altruísta, racional e ponderado, mas que exibe nas rachaduras o exato oposto do que diz representar. O problema não são essas críticas e provocações acontecerem, o problema é que elas são as únicas acusações que temos para mostrar. Na falta de uma alternativa de esquerda para o péssimo governo petista, a direita se apropriou do vácuo, tomou nossas ruas, e está tornando seu discurso cada vez mais hegemônico. Sem alternativa, estamos tendo apenas acusação moral para nos proteger, para envergonhar, para erguermos nossa trincheira. Os dias passam, entretanto, e o movimento pelo impeachment cresce, se educa, aprende. Nossas críticas deixam de ser eficientes não pela teimosia e irracionalidade do antipetismo, mas porque elas correspondem cada vez menos com a realidade. Em nossas mentiras agora reveladas, eles se fortalecem, nos criticam agora corretamente e crescem ainda mais.
No fim, o impeachment muito provavelmente não irá acontecer, mas isso não importa. Dia 15, a direita ganhou a política, ganhou as ruas, ganhou o povo, e provavelmente vai ganhar a eleição. Na incapacidade de dar resposta, a esquerda deixou que um discurso que aumenta a desigualdade social, mata a população pobre, diminui o salário dos trabalhadores e violenta as mulheres e homossexuais fosse mais acessível para o povo brasileiro que o discurso da emancipação e igualdade. O povo está caminhando unido para as trevas e a esquerda está do outro lado da cidade, rindo, apontando o dedo, se achando superior por isso e acreditando que assim tudo vai melhorar.

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